sábado, 3 de abril de 2010

Sonhando Com Lobos


Eu estava acordada,ou acordando...
Mas não abri os olhos porque sabia que se fizesse isso tudo aquilo sumiria. Eu podia sentir o calor dele apesar do frio que fazia.Esta deitada sobre o peito dele era reconfortante,seguir a cadência de sua respiração acalmava e seu cheiro era como um bálsamos pra mim.O barulho do gelo batendo lá fora no vidro da janela ,me tirou da mágica...agarrei o travesseiro na cama vazia...não era ele,mas tinha o cheiro dele e tentei voltar a fechar os olhos pra começar tudo outra vez.Eu tenho a habilidade de sempre voltar para o mesmo sonho...mas dessa vez não voltei.Eu precisava encarar.Eu tinha que despertar,acordar.Era inevitável encarar aquele dia de geada,as arvores que se contorciam na rajada de vento,o céu branco,a nevoa densa que fazia a manhã parecer fim de tarde.
Diante da janela o aperto no peito ganhou rosto,nome,forma...a névoa densa não me deixava vislumbrar nada ainda que eu quisesse,mas dentro da minha cabeça seu rosto era nítido e ele
não sorria.

Em algum lugar lá fora meu amigo estava. Em algum lugar lá fora um lobo vagava recusando sua humanidade, deixando-se cortar pelo granizo dessa manhã de inverno, deixando-se levar pelo instinto,pela raiva ou pela dor.Eu não pude fazer nada para impedi-lo de seguir,eu não tive o direito de atraí-lo e também não deveria ter de impedi-lo.Eu me sentia mal por ter lhe causado dor,por ter provocado seu exílio,afastado dos amigos.Eu me sentia mal porque tinha feito dele alguém amargo...e ele era doce,encantador,especial.

Era eu quem deveria estar lá fora sofrendo na tempestade. Eu merecia o vento,o granizo,as farpas dos galhos,as pedras escorregadias e cortantes por causa do gelo,não ele.Ele tinha sido apenas doce,meigo,amigo,forte,acolhedor.Ele tinha sido apenas meu porto seguro,meu norte,meu protetor...apenas meu...Ele tinha apenas me amado como eu não merecia e eu não tinha feito nada por ele,nem para impedi-lo,nem para ser merecedora disso.

Mas enquanto eu estava confortável no imenso quarto rosa com o aquecedor ligado ao máximo,o Lobo estava lá fora solitário e sem ao menos uivar um lamento,seu instinto básico de expressão.Eu o roubei do bando,do vale,da vida...eu o aprisionei em teias de seda,eu o domestiquei e o mantive perto.Mas não pude trazê-lo comigo.No lado frio que escolhi pra ficar os lobos não são bem vindos.

Desci as escadas e abri a porta da frente.Não podia ver nada do bosque que me faz a vizinha companhia desde que aqui cheguei,mas sabia que as árvores estavam lá.Não sabia quanto tempo meus pés agüentariam o frio ou minha pele suportaria o gelo mas dei três passos em direção ao que eu sabia ser a entrada da floresta.Eu não poderia jamais resgatá-lo,eu não poderia trazê-lo para viver comigo,mas eu poderia correr com ele.Correr até onde agüentasse segui-lo,correr sem ter que detê-lo,correr até sem ele saber,só correr,só estar ali.Eu não precisaria ser a Beta,mas me contentaria em correr paralela ao Alfa.Porque no momento a única certeza que tinha em meio ao caos que criei era de que precisava correr com ele,ou correr por ele,ainda que nunca o detivesse ou alcançasse.
E então eu acordei...

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